terça-feira, 27 de maio de 2008

A excisão

No passado dia 20 de Maio, fiz a excisão do tumor que me havia sido diagnosticado. O médico mantém o prognóstico de malignidade mas garantiu-me, com a mesma assertividade com que afirmou que era uma carcinomatose, que havia removido todo o tumor. Este era profundo e de crescimento rápido. Na altura um peso saiu de cima de mim, fui invadida até por alguma euforia. Afinal não passava de um susto. Quando acalmei, as dúvidas voltaram a assolar-me, até porque até saber os resultados da histologia o processo ainda não terminou. A origem e a causa do tumor podem conduzir a outros caminhos igualmente obscuros. Agradeço o apoio que tenho recebido, pode parecer piegas e um lugar-comum, porém este apoio tem sido fundamental. É bom sentirmo-nos mimados e acarinhados quando a vida resolve pregar-nos uma rasteira. Hoje fui tirar os pontos da cirurgia, a cicatrização está a correr nos parâmetros ditos normais. Neste momento, aguardo...prefiro nem partilhar os cenários, os pesadelos e as imagens que me ocorrem frequentemente. Prefiro pensar positivo, esquecer estas imagens e sorrir em relação ao futuro.
Não deixei de ir trabalhar e como a excisão é visível, tem sido alvo de curiosidade por parte de colegas e alunos. Partilho a reacção curiosa da Daniela, aluna do 9º ano que me enfrenta sempre com um grande sorriso nos lábios. Quando os colegas questionaram se eu tinha tirado um sinal, eu expliquei que era algo diferente, mais grave mas que estava tudo bem comigo. Os colegas não ligaram mais, no final da ficha de avaliação sumativa, a Daniela veio ter comigo e perguntou se eu tinha sido sujeita à remoção de um tumor. Olhei para ela de forma incrédula e anui com a cabeça. A Daniela explicou-me que ficou a pensar no assunto e como vê o Dr House chegou a esta conclusão. Não pude deixar de sorrir e agradecer a sua preocupação.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Carcinomatose...

-Isso é uma carcinomatose-disse o médico.
-Como? Não é um ponto negro que inflamou, um cravo, uma verruga?
-Não, é uma carcinomatose-diz o especialista após longa e cuidada observação.
E o meu mundo parou...eu paralisei. O cérebro esvaziou em segundos e apenas ecoou o som da expressão carcinomatose...o coração começou a bater lento ao ritmo da sentença: carcinomatose.
É verdade, foi-me diagnosticado um tumor maligno na face. E o mundo parou, pelo menos o meu, eu fiquei em pausa...todo o meu peso caiu, fiquei leve mas com o estigma do carcinoma comigo. Primeira reacção, após alguns momentos de paralisia, a responsável fui eu, mexi e tentei tirar um ponto negro, inflamei, degenerou...
- Não- garantiu-me o especialista-não foi responsável.
Não me recordo de sair do consultório, de chegar a casa ...continuei parada. Após algumas horas sem reacção...comecei a pesquisa veemente do significado de carcinomatose, enciclopédias, dicionários, internet, foi tudo lido e relido. Não fiquei mais descansada, carcinomatose, carcinoma ou tumor maligno, são expressões muito próximas e que se tocam. Nunca duvidei do diagnóstico, não chorei, apenas sobrevoei sobre a minha vida e aceitei que a partir daquele minuto a minha vida seria diferente. Logo agora que parecia que corria tudo tão bem, até parece cómico, mas é a realidade. Sentia-me realizada profissionalmente, adoro dar aulas e quero continuar a minha carreira docente, apesar dos obstáculos. Academicamente, estava a gostar da Pós-graduação e a sentir-me satisfeita com os resultados obtidos. Apenas, no âmbito pessoal, ainda não encontrei ninguém com quem partilhar a minha vida...porém esta situação nunca foi um drama para mim. Para mim, tragédia é um corpo estranho e maligno estar invadir o meu corpo através do meu rosto.
Esta mensagem foi escrita no domingo, 3 dias depois do diagnóstico mas apenas vou publicar após a excisão na 3ªfeira dia 20 de Maio. O resultado da análise para confirmar a malignidade virá posteriormente, após a biopsia.
Apenas desabafei com a minha mãe (o meu amparo), com a Telma (colega da Pós-Graduação), com a Palmira (colega e grande amiga) e com a Cristina (enorme amiga). A Palmira e a Cristina estão longe, estas amizades principiaram quando eu estive a dar aulas perto de Braga e continuam apesar da distância. As duas transmitem-me muita força e apoio. A Telma como batalhadora que é, está a lutar ao meu lado.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Quando dei aulas à adultos...

Pela segunda vez na minha vida profissional cruzei-me com um público adulto, enquanto alunos. A experiência é diferente mas sempre enriquecedora. Mas antes de contar essa experiência devo fazer a contextualização. Desde o princípio do ano lectivo que me encontro a leccionar a 5 turmas da Escola E.B. 2,3 de Vale Milhaços (2 do 7º ano de escolaridade e 3 do 9ºano) e apesar do desgaste e do trabalho que as 5 turmas dão, o meu horário não é completo. Significa que desde Setembro que tento arranjar outro horário compatível com este. A situação é tão deprimente que conheço pessoas que fazem quilómetros e leccionam em 3 escolas. A minha ocasião surgiu quando fui chamada para um horário nocturno de três meses na escola onde estudei (do 7º ano ao 12º ano) e onde mais tarde fiz o estágio profissional. Foi um regresso a casa...Sinto que aquela escola me marcou enquanto pessoa e que ali estarei sempre ligada. Portanto, é sempre saboroso recordar os bons momentos que vivi naquele espaço praticamente sagrado. Aquele é o meu lar, em termos profissionais.
E os alunos...???Em primeiro lugar com a idade bem mais avançada do que é costume, com outra motivação, mas também bem mais difíceis de conquistar. As suas histórias de vida são de certeza diferentes dos meninos do 7º ano mas mais importante, as suas perspectivas e expectativas são muito mais conscientes e responsáveis. Quando terminou a substituição, percebi que aqueles alunos poderiam ser meus amigos com quem eu trocava ideias numa mesa de café ou numa outra situação informal. Que aqueles discentes teriam tanto ou mais a ensinar e a partilhar comigo. Por essa razão denominei a experiência de enriquecedora.
O meu maior problema desta experiência prendeu-se com o trabalho e a responsabilidade de preparar aulas para o 12º ano. Encaro o meu trabalho com muita seriedade o que implica um trabalho cuidado de preparação das matérias a leccionar. Quando à preparação das aulas de três diferentes níveis de escolaridade se junta o estudo de uma Pós-graduação...as consequências pessoais não são muito positivas. Por sentir que não ia aguentar muito tempo a este ritmo, já recusei um novo horário numa outra escola secundária. Era incapaz de estar a trabalhar e impossibilitada de dar o meu melhor...Daí a escolha.